sexta-feira, 17 de abril de 2015

Por uma gestão Educacional notável

“O diretor deve ser persistente na busca pela perfeição para todos, alunos e docentes”. 
A frase, do professor e consultor educacional inglês Anthony McNamara, do National College for Teaching and Leadership (Faculdade Nacional para Ensino e Liderança) – NCTL, na Inglaterra, resume o pensamento do país europeu sobre como deve ser a rotina de um gestor que deseja uma escola reconhecidamente notável. McNamara tem mais de 18 anos de experiência como professor, coordenador e gestor escolar na Inglaterra, os quais ele usa agora para ensinar educadores brasileiros e britânicos no NCTL.
Em agosto, McNamara foi um dos palestrantes convidados do I Seminário Internacional de Boas Práticas em Gestão Escolar, promovido pelo Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed). Na oportunidade, ele conversou com a Gestão Educacional sobre as principais características de um diretor de uma escola notável, quais práticas ele deve promover, como manter uma gestão democrática em uma instituição de ensino e os principais desafios da gestão escolar de alta qualidade. Para o especialista, o diretor convive com a responsabilidade de garantir um aprendizado de alto nível para os alunos e um ambiente de trabalho de qualidade para os colegas educadores, mas não sem ter pulso firme e saber dosar o trabalho com as horas de lazer e descanso.
Gestão Educacional: Quais são as principais características do gestor de uma escola notável?
Anthony McNamara: Os gestores de escolas notáveis não precisam ter um conjunto de qualidades para conseguir motivar e ganhar o respeito de colegas, alunos e pais. Estamos, primeiro, falando de aspectos do caráter, da personalidade do gestor, os quais são incrivelmente importantes. É preciso que ele mostre integridade, para que as pessoas tenham confiança nele (ou nela), e determinação, porque é uma tarefa difícil gerir uma escola. É preciso resiliência também, porque, às vezes, é muito difícil. Um diretor pode passar por dias difíceis e ficar um bocado decepcionado, mas ele precisa ter coragem para continuar. Bom juízo também, mas talvez a mais importante de todas as qualidades seja a inteligência emocional. É compreender que os colegas, os alunos e os pais têm suas dificuldades e seus desafios, ou seja, aquele diretor que compreende que as outras pessoas têm seus problemas, que não aceita isso como justificativa para um desempenho inadequado, mas que usa essa compreensão para ganhar a confiança de outras pessoas. O diretor de uma escola notável necessita de uma atitude animada, entusiástica e curiosa em relação à vida e, também, de um forte compromisso com a justiça e a igualdade. Ele também não deve ser um administrador. Administração é importante, mas o mais importante é colocar as crianças em primeiro lugar. O diretor deve ser persistente na busca pela perfeição para todos, alunos e docentes. É necessário ter uma visão estratégica e inclusiva, não apenas para a sua comunidade escolar. Essa visão deve ser comunicada amplamente por meio de vários métodos e de uma maneira atrativa e acolhedora, pois ela deve ser partilhada e integrada às opiniões de docentes, pais e alunos.
E quais são as características das escolas notáveis?
McNamara: As escolas notáveis estabelecem padrões educacionais desafiadores, mas alcançáveis, e acompanham o progresso de cada criança, a fim de combater a desigualdade. Uma das principais funções da escola é diminuir as diferenças entre meninos mais privilegiados e crianças menos favorecidas. Para fazer isso, é preciso investir mais recursos no apoio de alunos com necessidades escolares ou que vêm de um contexto socioeconômico baixo. Para gerir uma escola notável, é preciso também recrutar pessoas com qualidade excepcional e continuar a apoiá-las, oferecendo formação profissional de alta qualidade e com foco na melhoria contínua das competências pedagógicas.
Quais são as práticas pedagógicas presentes em uma escola notável?
McNamara: O mais importante é entender as maneiras mais eficazes de aprender. Vamos começar não com o ensino, mas com a aprendizagem, ver como os alunos aprendem e construir a pedagogia priorizando os processos de aprendizagem. Isso significa que todos os elementos do ensino terão que levar em conta a maneira como o aluno aprende. Vou dar um exemplo: quando um professor pergunta à classe “Qual é a capital da França?”, os alunos que levantam os braços para responder o fazem porque já sabem a resposta ou são muito confiantes e não se preocupam em errar. Mas os outros alunos que estão sentados não compartilham da resposta, o que não é bom para eles, pois podem acabar preguiçosos e sem se engajar na lição. Devemos ensiná-los [aos professores] como fazer perguntas, de maneira que todos os alunos estejam engajados no processo da resposta. O professor pode dizer: “Eu tenho uma pergunta para vocês: Qual é a capital da França? Agora, eu não quero que vocês levantem os braços. Não vou dizer nada por 10 segundos e todos têm que pensar. Vocês podem até conversar com o seu vizinho, pois nem todos sabem a resposta. Depois, eu vou nomear quem responderá”. Todo mundo foi engajado pela pergunta. Essa pergunta é muito fácil, porque há o correto e o não correto. Se depois você fizer perguntas mais complexas, em que o aluno precise realmente raciocinar, esse processo de lançar a pergunta e dar um período pequeno de silêncio para todos pensarem e explorarem uma possível resposta faz com que todos se engajem. Quanto mais oportunidades houver para os alunos se engajarem no processo de aprendizagem, menos oportunidade haverá para a falta de atenção e o mau comportamento. Portanto, a sala de aula bem gerida conta com professores que entendam como engajar o interesse de todos os alunos e consigam manejar o tempo, de modo que todos tenham interesse no que eles estão dizendo, e saibam avaliar os alunos, de forma que estes saibam se estão tendo progresso. Além disso, um professor que explique as áreas em que os alunos tenham menos confiança e cometam mais erros também ajuda. Ou seja, é preciso haver uma preocupação intensa com a pedagogia.
Como são os bons diretores de escola na Inglaterra?
McNamara: Na Inglaterra, nós pensamos nos melhores diretores de escola. Antes de eles assumirem como diretor, eles já eram bons professores, ou seja,  subiram pela hierarquia da escola, ou seja, por mérito. Eles são um modelo a seguir: entendem realmente quais são os reais desafios de ensinar [durante as] aulas. Pensamos também que é bom que o professor-diretor continue a ensinar. Então, [um bom diretor coloca a] pedagogia em primeiro lugar e tem aspectos de boa liderança, como as características que citei anteriormente: inteligência emocional, determinação e capacidade de pensar estrategicamente.
Em sua opinião, qual é a importância dos resultados de avaliações externas, como o Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa), para uma instituição escolar?
McNamara: É muito importante que as escolas tenham metas desafiadoras, mas alcançáveis pelos alunos. E qual [meta] seria melhor do que comparar o progresso dos alunos com os melhores sistemas [educacionais] do mundo? Por meio do Pisa, do Talis [Pesquisa Internacional sobre Ensino e Aprendizagem, sigla em inglês], ou seja, por meio desses sistemas de avaliação do desempenho de vários países, nós sabemos em quais deles os alunos estão progredindo mais rapidamente. Ao investigarmos essas nações e os seus sistemas de educação, podemos identificar elementos comuns. Sabemos, por exemplo, usando os dados do Pisa, que nos melhores sistemas de ensino, os diretores têm muita autonomia e têm dados muito bons sobre cada um de seus alunos – eles incluem todos os alunos em seus dados, não somente aqueles que são espertos e inteligentes, ou dão preferência àqueles com necessidades educacionais especiais. Esses países investem muito, mas muito dinheiro em suas escolas, para que fiquem bonitas e tenham boas instalações boas, valorizam o magistério como uma profissão que as pessoas realmente queiram seguir e os licenciados que estejam no topo da sua capacidade intelectual. São pessoas que querem seguir a profissão porque ela é bem paga e respeitada. Esses exames ajudam os países a determinarem quais devem ser suas prioridades. Sabemos que há certos problemas com programas como o Pisa. Sabemos, por exemplo, que o melhor país do mundo [em educação] é a Coreia do Sul, que tem uma pedagogia um pouco maquinal. Os alunos estudam para quatro exames a cada ano e memorizam páginas e mais páginas de fatos para responderem às perguntas do exame. O problema é que as competências que nós vamos precisar no século XXI não são ensinadas. É bom memorizar fatos, mas não é essa habilidade que ajudará os países a se desenvolverem. Precisamos de pessoas com inteligência emocional, capazes de tomar iniciativa e trabalhar em grupo. Então, como medir e avaliar competências mais complexas? Não se pode avaliar algumas dessas competências com um exame formal, em que todo mundo está sentado, escrevendo ao mesmo tempo. Claro que se pode fazer isso com Matemática, Gramática, mas não se pode avaliar competências mais complexas. Não resolvemos totalmente os desafios que enfrentamos, mas acredito que os países devem olhar com grande interesse o que está acontecendo nos grandesrankings mundiais. É bom para o Brasil tomar nota do progresso de países em contextos semelhantes ao brasileiro para ver se realmente o sistema brasileiro de educação está funcionando tão bem quanto o país, talvez, queira.
Como o gestor pode possibilitar uma gestão participativa e democrática na escola?
McNamara: Todos somos líderes e precisamos apoiar as qualidades e as competências em todos os escalões de uma escola. Mas ainda não estou totalmente convencido disso, da gestão democrática na escola, pois é preciso tomar decisões difíceis. Por exemplo, se houver um professor que não está ensinando bem e, depois de muitas tentativas de ajudá-lo a melhorar seu ensino, [este continuar] com absenteísmo e sem engajar seus alunos, não podemos ter uma escola notável mantendo professores fracos e resistentes ao desafio e ao apoio. Às vezes é preciso demitir, e essa é uma decisão difícil, porque os professores são leais uns aos outros. Pode-se dizer que eles não estão contentes, pois a existência de professores fracos gera problemas também para os outros: em uma aula fraca, os alunos ficam mal comportados, [comportamento que se reflete] também na próxima aula. Agora, é outro professor que tem problema com os alunos indispostos a aprender. É preciso que o líder tome decisões difíceis. Apesar de eu ser totalmente a favor da democracia quando for possível, às vezes o diretor deve tomar decisões difíceis. É algo que eu, de vez em quando, tive que fazer. Foi horrível, mas eu sei que isso foi bom para a escola, porque eu estava preocupado com os alunos, que perdiam suas perspectivas futuras por causa da presença de um professor fraco. É um dilema. Não se pode ser totalmente democrático, pois é preciso ter, às vezes, a coragem para tomar decisões difíceis.
Para concluir, quais são os desafios do gestor escolar na atualidade e qual é o caminho para superá-los?

McNamara: Há muitos desafios. É uma pressão extraordinária. No meu caso, eu era responsável por 1,1 mil alunos e queria proteger os interesses de cada um deles. Tinha responsabilidade também por 130 pessoas e queria proteger os interesses de cada um de meus colegas. Essa responsabilidade é uma carga enorme sobre os ombros de qualquer indivíduo, e é preciso que esse indivíduo tenha apoio, seja por meio de contato regular com seus homólogos, seja por meio de uma pessoa responsável pela rede de escolas, seja por meio de alguém com quem falar sobre as frustrações e dificuldades. Manter os níveis de ensino também é uma responsabilidade muito difícil. Você precisa saber o que está acontecendo na sala de aula, fazer o esforço de acompanhar as lições, falar e acompanhar os colegas professores e assegurar que eles se sintam bem. Uma coisa que acontece também, e que eu descobri nos anos em que fui diretor, é que quanto mais apoio eu dava aos meus colegas, mais eles me apoiavam. Tínhamos um interesse mútuo para enfrentar as dificuldades. É preciso ter coragem de desafiar e falar abertamente sobre os problemas, mas, se houver confiança entre a equipe, isso ajuda muito. Eu acredito também que nós trabalhamos para viver, e não vivemos para trabalhar. É preciso que o diretor tenha oportunidade de descansar, de passar tempo com a sua família, de ler muitos livros, de fazer exercícios e de ter uma vida fora da escola. Porque somos seres humanos e, se ficarmos todo tempo na escola, vamos perder alguma coisa.
Fonte: http://www.gestaoeducacional.com.br/index.php/reportagens/entrevistas/1002-por-uma-gestao-escolar-notavel

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