sábado, 1 de fevereiro de 2014

Entrevista com PAULO FREIRE

PAULO FREIRE

Globonews - Repórter Edney Silvestre - programa Milênio
 No Brasil existem quarenta milhões de analfabetos. Podia não ter nenhum, porque existe um método simples, direto e barato capaz de alfabetizar uma pessoa em pouco mais de um mês. Este método foi inventado pelo brasileiro Paulo Freire há mais de trinta anos. Desde a primeira experiência com trabalhadores rurais em Angicos, Rio Grande do Norte, que o método Paulo Freire mostrou resultados e eficiência impecáveis. Desde então o método Paulo Freire vem sendo adotado em diversas partes do mundo.
E o que fizeram com Paulo Freire no Brasil?
Ele foi preso após o golpe militar de 64, perseguido e obrigado a viver no exílio. Apesar de ter voltado após a anistia, mesmo tendo sido Secretário de Educação, do governo da prefeita Erundina em São Paulo, ele continua sendo mais reconhecido, homenageado e respeitado no exterior do que no seu próprio país. Ele estava a caminho de Harvard para dar um curso, quando nós o pegamos para esta entrevista. Ela foi feita na “Island House”, no centro de cultura da Universidade de Nova York, que abriu as portas para nós com a maior boa vontade porque o entrevistado era o mitológico educador Paulo Freire. É esse brasileiro extraordinário que o “Milênio” apresenta agora.
Repórter: Como surgiu o método Paulo Freire de alfabetização?
Paulo Freire: Eu talvez pudesse dizer a você e a quem nos vê e nos ouve, que essa questão do meu trabalho no campo da alfabetização de adultos e, simultaneamente, no campo da educação em geral, tem uma origem muito remota, quer dizer, eu não tenho dúvida nenhuma de que a minha relação com meus pais e o testemunho de meus pais, a exemplaridade com que eles foram educadores de mim e dos outros filhos, irmãos meus, isso me marcou enormemente e do ponto de vista da tarefa de ensinar é algo que também na infância aparecia como no mínimo uma boa curiosidade diante do mundo, quer dizer, eu fui, as crianças de um modo geral são curiosas, mas eu tive uma especial curiosidade em saber coisas e querer aprender. Eu acho que aí está uma remota razão, já na mocidade eu acho que o que mais me tocou para que eu buscasse, para que eu pesquisasse algo, foi o que me parecia uma profunda injustiça e uma imensa ofensa aos adultos que não tendo sido, não tendo tido oportunidade de estudar, enquanto crianças chegaram a maturidade sem o comando da palavra escrita. Isso me parecia como me parece um absurdo, quer dizer, é uma espécie de pilhagem, não é? É como se o mundo que lê pilhasse o mundo que não lê do direito e da possibilidade de ler, quer dizer, a alfabetização, o analfabetismo no fundo esconde uma proibição, que é uma proibição de classe social.
Repórter: Dessa razão ética e dessa razão política é que teria vindo sua paixão por ensinar?
Paulo Freire: Exato, entende. Eu não tenho dúvida nenhuma de que eu não posso ser entendido fora de uma compreensão da ética em mim e da política em mim. Eu acho que nenhum educador, nenhum pensador da educação está afastado disso. Quer dizer a educação enquanto formação humana é um esforço indiscutivelmente ético e estético, quer dizer, não há como separar também a decência da boniteza, a educação enquanto busca de boniteza necessariamente procura a decência também, a decência do ser e a natureza política dela, da educação, nos inviabiliza de ser neutros, você tem que no fundo ter uma opção, você tem que ter uma escolha e depois brigar pela sua escolha e brigar pelo seu sonho. Então, o meu primeiro ponto de partida era essa convicção de que afinal e não só em alfabetização a educação implica numa certa convivência ou uma relação, que não pode ser rompida, entre o conteúdo que se pretende ensinar e a experiência social e cultural que tem que ver com a identidade cultural, com os anseios, com os medos, com as frustrações do educando e não do educador. Isso não significa inclusive que o educador não possa e não tenha o direito de falar também de suas preferências culturais, mas o que ele não pode é fazer o trabalho educativo partir de suas preferências culturais quando sobretudo o que ocorre é uma diferença de classe social entre o educador e o educando. Nem sempre, mas quase sempre. Então esse é um ponto de vista, primeiro. O segundo ponto de vista, minha segunda certeza até, mais que um ponto de vista, que eu tinha, e tenho e continuo tendo é de que no caso da alfabetização, por exemplo, a alfabetização é uma experiência criadora e significa que o alfabetizando tem que criar tem que multar pra usar uma expressão mais técnica o seu sistema de sinais gráficos, quer dizer, ele tem que ser no fundo o arquiteto desta produção ou desta criação, obviamente, ajudado, ele ou ela, ajudado pela educadora ou pelo educador. Mas o que eu quero dizer, é que o exercício de tornar-se capaz de ler e escrever exige de quem realmente aprende uma postura de sujeito que cria o seu próprio aprendizado. Eu costumo inclusive usando um jogo, um jogo verbal, eu costumo dizer que você só aprende quando você apreende a razão de ser do objeto que você aprende. Entende? Então quer dizer, aprender é uma experiência de quem cria e não uma experiência de quem é teleguiado. Então quer dizer, a minha crítica, o que eu chamei de ‘bancarismo’ na educação, que é exatamente essa prática educativa em que o professor deposita, é como se o professor abrisse a cabeça do educando e metesse lá dentro os pacotes de conteúdos. Isso é uma inconsistência, isso não tem sentido, então eu defendia por isso mesmo então, o direito que o alfabetizando tinha, que tem, de fazer parte da criação da sua capacidade de ler e de escrever. Uma outra coisa pra terminar essa pergunta, é a certeza que eu tinha e que eu continuo tendo, é que a prática ensinante e a prática de aprender da aprendizagem, são práticas que se dão num clima que deve, necessariamente, ser num clima de boniteza, quer dizer, e de alegria, você imagine uma das coisas mais tristes era a concepção clássica de uma escola severa, austera e...
 Repórter: Punidora...
Paulo Freire:...Punidora, em que punir se apresentava como sendo o caminho sine qua para a formação do educando. Obviamente que eu não estou aqui defendendo uma pedagogia licenciosa, uma pedagogia espontaneísta de jeito nenhum, eu estou absolutamente convencido de que a liberdade não cresce nem se constitui sem limites, quer dizer, ela tem inclusive o grande problema da liberdade é como assumir os limites eticamente e não como assumir com medo da autoridade, quer dizer, o pai que grita, esperneia e que tem o filho silenciado, não é o pai que convence e que discute e que tem um filho silencioso. Quer dizer, o que eu quero é um filho que saiba assumir o silêncio e não um filho que viva silenciado, entende? E isso exige o respeito ético dos limites, mas eu estava certo e continuo hoje de que a escola com que eu sonhava era uma escola de alegria, uma escola de festa, mas também e necessariamente uma escola de rigor, de seriedade científica.
Repórter: O senhor disse na sua expressão "filho silenciado", me parece uma metáfora interessante pra falar do que se passou com o Brasil em 1964, quando nós tivemos o golpe militar. O que aconteceu especificamente com o senhor, a partir do golpe militar de 64?
Paulo Freire: Exato, eu fui silenciado. Agora eu só não, obviamente, quer dizer, o país foi silenciado e o que é incrível não são essas contradições que se dão na história, afinal de contas os militares silenciaram a sociedade civil brasileira em nome da fala da sociedade brasileira, quer dizer, em nome do discurso, em nome do direito de voz, de ter voz, quer dizer, os militares se fundavam na ‘comunistização’ do mundo. E quando eu me lembro disso, eu me lembro que eu fui apontado, com o processo todo de alfabetização no país, o movimento que eu coordenava, eu fui apontado como o ‘bolchevizador’ e o anticristo, quer dizer, é uma coisa de um imenso ridículo, sobretudo quando você pensa que isso foi em 64, se disse isso em 64, é velho demais! Esse discurso... Me atrasaram demais... É medieval, entende. Eu hoje acho que o Brasil não tem condições pra golpes, não só o Brasil, mas em tudo o Brasil na América Latina, mas acho também que a sociedade civil precisa ficar atenta, desperta com relação a um indiscutível poder do executivo brasileiro, quer dizer, o chamado governar por decretos, quase. Como é que chama aquelas medidas...
Repórter: ...Provisórias, medidas provisórias.
Paulo Freire: Provisórias. É uma quantidade que não se acaba, nunca a provisoriedade ficou tão efetiva, entende. Eu acho que isso é uma ofensa também, à democracia, mas isso no fundo isso é um vestígio do autoritarismo de que o presidente não escapa como brasileiro, entende. Quer dizer, eu acho que daí a necessidade pra mim à vigilância que o educador e, portanto um político democrático de opção democrática coerente com a sua opção, daí a necessidade da vigilância no sentido de buscar a coerência, quer dizer, não é possível fazer um discurso da democracia e usar tanta coisa antidemocrática, quer dizer, você não pode ter uma prática antidemocrática pra selar o seu discurso democrático.
Repórter: Mas em 64 o senhor foi preso, eu não sei se chegou a ser torturado?
Paulo Freire: Não, não, não, mas eu fui, eu acho que fui torturado, entende... Por exemplo, todos nós fomos, porque no fundo, eu, por exemplo, quando eu me lembro de que eu fui posto num xadrez...
Repórter: O senhor foi preso em Recife?
Paulo Freire: Em Recife. Eu fui posto numa cela de um quartel do exército, em Olinda, que eu te confesso inclusive que quando o oficial mandou abrir a porta e eu entrei, eu confesso a ti, a você e a quem nos vê e ouve que eu tomei um susto. Eu tomei um susto porque eu não imaginava que em 1964, portanto duas décadas, ou quase três antes de terminar o milênio, houvesse ainda uma prisão pra gente como aquela e eu pensei que não havia mais aquilo e o que é triste, é que eu acho que ainda continua a haver, quer dizer, afinal de contas me puseram numa cela que tinha 1,70 m, que é exatamente o que eu tenho, de fundo, por 0,60 de largura. Eu te confesso eu acho isso uma ofensa à dignidade humana, entende. Eu faria até agora, através de vocês um apelo ao poder que nos ouça, não importa se civil ou militar, que acabe com isso! Vamos ser gente! Vamos ser gente! E não bicho bravo. Vê bem, a gente briga pelos direitos dos animais e a gente briga com certeza, com legitimidade na defesa dos outros animais, não é possível que no nosso mundo, na dimensão da existência você ainda mantenha prisões desse tipo.
Repórter: Nessa cela em Olinda quanto tempo o senhor ficou?
Paulo Freire: Eu passei três dias nela. Mas te confesso, olha, uma coisa estranha que eu vou te dizer, aprendi algumas coisas, por exemplo, como... Como por exemplo, aprendi o valor da paciência, que dizer, não de uma paciência de silenciados, mas de uma paciência silenciosa, de uma paciência que permuta com a impaciência, quer dizer, aprendi, aprendi também...
Repórter: Não seria paciência da resistência?
Paulo Freire: Da resistência, não é? A necessidade existencial de resistir e por isso mesmo eu aprendi, por exemplo, na minha experiência de preso, eu aprendi quanto a obediência, às vezes, a obediência do silenciado, que não é ética, mas quanto às vezes essa paciência, essa obediência do silenciado, é uma resistência do silenciado, quer dizer, eu me lembrava por exemplo de como deveria ter sido duro o escravo, levando pancadas violentas, açoites, preso, amarrado no tronco e obedecendo tanto quanto podia. E a obediência passou a ser uma resistência na medida em que obedecendo mesmo absolutamente, salvava a vida. E preservar a vida para quem precisa brigar para ‘decentizar’ o mundo é fundamental. Eu digo no último livro que acaba de sair no Brasil, eu digo que... Não, não, não é esse. O último livro chama-se “Pedagogia da Autonomia” e esse acaba de sair aqui. Eu digo que o homem e a mulher, através da história viraram capazes de ‘eticizar’ o mundo, quer dizer e não havia como continuar sendo homem e mulher sem ética. E precisamente ou somente porque somos nós os viabilizadores da ética ou da ‘eticização’ do mundo, nós somos também capazes de transgredir a ética. Você, por exemplo, nunca ouviu falar que tigres africanos tenham sacudido bombas em cidades de tigres asiáticos, e isso, nunca se ouviu falar na história que uma família de leões tenha covardemente matado membros de outra família e a noite tenham ido à família levar o seu pêsame. A gente faz isso, entende, nós fazemos isso. Pra mim então, uma das brigas que a gente deve dar enquanto estiver no mundo e com o mundo e com os outros é exatamente diminuir a possibilidade de transgredir a ética, portanto, de assumir eticamente de tal forma a ética que você diminua a possibilidade de ‘deseticizar’ o mundo, portanto de evitar as transgressões, você veja com o mundo todo, não é só o Brasil, mas no nosso caso particular, quer dizer como a sem-vergonhice que se democratizou de maneira extraordinária no país. E é preciso, a sociedade precisa voltar, é preciso que se perceba no Brasil que a impunidade vai se acabar entende? Porque sem, com a impunidade você não restaura a ética, não creio. Só com discurso não faz, entende? Quer dizer, eu acho que essas coisas que não são valores precisam ser tomadas muito a sério hoje, pelos políticos que são educadores e pelos educadores que também são políticos, quer dizer, não é possível esquecer isso, a ética que está campeã do mundo é a ética do mercado. E essa é uma ética malvada e perversa, absolutamente perversa. É uma ética ‘deseticizante’ e a gente precisa lutar pela ética universal do ser humano, quer dizer, a ética que corresponde a uma natureza humana que se vê social e historicamente constituída através dos tempos.
Repórter: A entrevista com Paulo Freire foi tão extraordinária que pela primeira vez uma edição do “Milênio” vai ter continuação. A segunda parte da entrevista com Paulo Freire será apresentada semana que vem. Até lá!
Parte de entrevista de Paulo Freire para o “Milênio”, você vai conhecer o lado mais íntimo do educador, do homem que aos 66 anos reencontrou o amor. Aqui também ele fala da vida no exílio, a visão de uma sociedade mais justa e mais humana, e mostra uma incansável esperança num mundo melhor, mesmo que este mundo melhor, como diz o próprio Paulo Freire, só chegue muito depois dele ter partido.
Repórter: O senhor é idealista, um sonhador, o senhor tem esperança?
Paulo Freire: Claro, claro. Essa questão da esperança e comigo é uma coisa muito interessante, precisamente pela forma ou pela maneira ou pela razão como eu entendo a esperança na existência humana, quer dizer, há pessoas que me consideram um sonhador e eu sou um sonhador, mas não um sonhador maluco. Mas há pessoas que me consideram um idealista, mas um idealista perigoso e pra mim não. Pra mim a esperança, a esperança faz parte disso que a gente vem chamando natureza humana, que no fundo é algo que se constitui social e historicamente na nossa experiência no mundo com os outros. E por que isso? Eu estou absolutamente convencido de que a inconclusão, o interminado é uma característica da experiência vital. Quer dizer, onde há vida há inacabamento, mas ao nível da experiência existencial que é a nossa, o inacabamento que continuou, nós somos tão inacabados quanto às árvores, quanto os animais, outros...
Repórter: O senhor está chamando de inacabamento a continuidade?
Paulo Freire: Exato. E pela incompletude do ser mesmo. Mas acontece que ao nível nosso, do homem e da mulher e nós nos tornamos capazes de em certo momento dessa experiência histórica do próprio inacabamento nós nos tornamos capazes de conhecer ou conhecer-nos como inacabados. Quer dizer, o inacabamento, mais do que o puro inacabamento, nós somos conscientes do inacabamento. Ora, a minha tese é a seguinte, um ser que inacabado, se sabe, porém, inacabado ele necessariamente se insere num permanente processo de procura. A educação é esse processo, e agora a minha pergunta é a seguinte: será possível procurar-se a esperança? Entende, quer dizer, eu acho uma imensa contradição, por isso eu respeito os desesperançados, eu reconheço razões de ser que explicam a desesperança, mas a desesperança é um desvio, é uma distorção da vocação de caminhar que é nossa, que nós inventamos, entende? Então a esperança em mim não é como eu disse num dos meus livros mais recentes, eu não sou teimosamente esperançoso, quer dizer, eu não sou esperançoso por teimosia, eu sou ontologicamente, faz parte da natureza do meu ser a esperança. Então eu não posso negá-lo, agora o que é que acontece? Há momentos históricos e que pertencem não só a mim, não apenas da minha história individual, mas também dela e da história social em que eu me deixo tocar, pelo risco da desesperança, no momento em que eu me percebo um pouco desesperançoso eu resisto, entende. Eu resisto, quer dizer, eu brigo contra mim mesmo ou brigo comigo mesmo. Eu analiso a razão de ser da minha desesperança para poder superar essa razão de ser. Quer dizer, no fundo eu sou inveteradamente esperançoso, eu tenho um certo gosto, um gosto gostoso, um gosto verdadeiro que é no meu ser, na intimidade do meu ser de brigar pela esperança. E fora disso eu não me entenderia no mundo.
Repórter: Mas mesmo hoje, mesmo depois do que aconteceu no Brasil em 64, do que aconteceu no Chile em 75, mesmo depois da queda dos países socialistas da União Soviética, o senhor ainda tem uma esperança política ao menos de construir uma sociedade mais justa?
Paulo Freire: Claro, talvez até mais do que antes. Eu... Olha, eu não tenho dúvida nenhuma de que com a queda do chamado muro de Berlin, com a queda do chamado socialismo... Socialismo como é que é? Tinha um nomezinho oficial, que no fundo era um socialismo ‘policialesco’, com a queda do estalinismo eu acho que o sonho por um mundo menos feio vai ter condições, não exatamente agora, mas passada a estupefação que no fundo, por exemplo, comecemos pela estupefação das esquerdas, as esquerdas no mundo entraram em estupefação diante das pedras do muro caído. Levantando-se da estupefação alguns elementos da esquerda ficaram mais rigidamente estalinistas, é uma minoria que eu acho que, com todo o respeito que eu tenho, é uma minoria que perdeu o endereço da história, uma quantidade razoavelmente grande dessa esquerda que lutou, que brigou em defesa dos interesses populares, em defesa da decência, em defesa dos silenciados, para que aceitem o silêncio enquanto manifestação ativa da luta, mas jamais ser silenciados. Uma grande quantidade de gente da esquerda estupefata aderiu ao discurso neoliberal. E veja bem, eu acho que eu e você temos um direito extraordinário que é o direito de mudar, não tenha dúvida, eu brigo pelo direito que eu tenho de mudar, agora eticamente eu acho que eu tenho que assumir que mudei, o que eu não posso é mudar e dizer que não mudei, o que eu não posso é mudar e pretender ter, continuar a ter o mesmo respeito dos meus companheiros anteriores que me respeitavam precisamente pelas ações políticas contrárias as que eu tenho hoje, entende, quer dizer, por exemplo, se eu amanhã cismar e me convencer de que o discurso neoliberal é o correto eu escrevo um livro sobre isso e digo: “olha, não venha aqui pra falar em processo libertador porque eu acredito mesmo é na ideologia imobilizadora da história, o que eu acredito mesmo, é que a educação deixou de sonhar, não há mais que sonhar na educação, não há mais que pensar em utopias na educação, a educação tem que ser uma prática, uma experiência puramente pragmática de treinamento do educando”. É treinar tecnicamente e cientificamente o educando, mas enquanto, o que eu não posso é virar esse tipo de homem, querendo, contudo dizer que sou o mesmo que escreveu esse livro que está na sua mão “Cartas à Cristina", entende. Não é, eu preciso ser coerente com o direito que tenho de mudar. Mas você me perguntou se apesar de tudo isso eu continuava otimista, esperançoso...
Repórter: O senhor ainda acredita na utopia socialista?
Paulo Freire: Eu acredito, eu não vou ver esse negócio, mas a história não se faz, a história não se faz com as presenças de quem sonha, todos os caras que sonham presentes pra ver a história mudando isso, mas os outros que vêem, eu acho o seguinte, que Darcy (Ribeiro) não vai ver, outro, Callado (Antonio) grande homem que morreu tão recentemente, eu, você, nem você vai possivelmente ver, mas seus netos vão ver. Eu não creio, te confesso, acreditando nisso, que eu chamo projeto humano e mesmo que ameaçado e submetido a uma série de influências tecnológicas indiscutíveis no mundo que podem amaciar a curiosidade, amaciar a vontade, mesmo assim eu acredito que o projeto humano ganhará um dia. Quer dizer, recentemente eu li um artigo de um padre suíço, de um jornal suíço, de um título muito grande e era mais ou menos o seguinte: "será, será que a globalização dará ou não dará lugar a um outro maio de 68?", quer dizer, um artigo excelente, sobretudo um suíço mostrando com uma imensa inquietação a inviabilidade da continuidade de um tal processo, quer dizer, eu acho que no mundo, o que há de gente em nós e vai se rebelando e vai se rebelar, contra uma ética que só cuida do núcleo, entende? Essa não é a ética humana, uma ética, olha, eu te digo mais, a liberdade de comércio que se sobrepõe à liberdade das mulheres e dos homens é uma licenciosidade e não uma liberdade é uma imoralidade, quer dizer, isso é imoral. E eu não creio que a gente perdure muito tempo tão imoral, quer dizer, convivendo com distorções, então, mas é claro, você tem todo o direito como centenas de pessoas que possam me ver e ouvir, e dizer: “Paulo, continuas um sonhador”, graças a Deus, continuo um sonhador, quer dizer, eu aposto no projeto humano.
Repórter: Há uma história curiosa sua, pessoal, que eu não sei se o senhor se incomoda de contar, que foi seu reencontro com dona Ana Maria.
Paulo Freire: Com?
Repórter: Com dona Ana Maria, com a sua esposa. O senhor se incomoda de contar?
Paulo Freire: Ana Maria é minha mulher, nós nos casamos há oito anos, eu devo muito, eu tinha perdido minha primeira mulher que trabalhou enormemente comigo e que me acompanhou, que me ajudou, que me assessorou... Até que eu tenho uns amigos que dizem que eu era a teoria da prática dela...
Repórter: A Elza?
Paulo Freire: A Elza. Eu acho que era uma injustiça a ela, e uma injustiça a mim, ela era também teórica e eu também sou prático. Mas ela morreu e a morte da Elza me destroçou e a morte do marido da Ana Maria também a destroçou. E ela, nós somos amigos desde ela menininha e nos casamos, nos casamos em busca da reinvenção de nós mesmos, quer dizer, abalado como eu estava, mas uma coisa interessante, eu estava abalado, mas não desesperançado. Até aí nesse momento, que foi um momento dramático da minha vida. Mas a chegada da Nita, e foi absolutamente importante e fundamental, quer dizer, ela me ajuda a refazer-me, a me reconstruir, quer dizer, essa é uma outra que eu acho quando a gente descobre humildemente a importância de uma outra pessoa na reconstrução da vida da gente. É uma coisa bonita também, é uma coisa gostosa. Eu tenho, quer dizer, a minha gratidão por Nita é menor do que o meu amor por ela, quer dizer, porque se só fosse gratidão não valia, por gratidão eu não continuaria com ela, mas que existe também a gratidão, existe. Mas existe uma amorosidade que reforça a gratidão.
Repórter: No tempo que o senhor vivia no exílio, como o senhor se sentia?
Paulo Freire: Olha, eu só não te diria que eu me sentia destroçado porque afinal de contas  é muito difícil com que eu me destroce, entende, mas eu sofri profundamente. Então, havia dimensões da nossa cultura que me fustigavam, como por exemplo, o gosto da comida, o gosto da comida era uma coisa no exílio, enorme, quer dizer, quando eu viajava pros Estados Unidos ou quando eu viajava pra outros países da Europa, eu saía, eu já tinha os endereços de onde conseguia comer uma má ou boa, porque pra mim é sempre boa uma feijoada, mas a música também, a língua, a entonação, afinal de contas, eu acho que a cultura que é tudo isso e mais do que isso é uma coisa que não nos deixa, quer dizer, você quando anda, você anda com a sua cultura e não há como sacrificar sua identidade cultural. Eu acho, eu nunca me senti melhor do que ninguém porque sou brasileiro, mas nunca me senti pior do que ninguém porque sou brasileiro, quer dizer, eu tenho uma alegria especial por ser brasileiro e não um orgulho maluco, porque seria inclusive burrice, mas um gosto, um gosto de falar esse português nordestino, entende?                                                                                   .
R
epórter: O gosto mesmo tendo sido expulso do seu país, mesmo não podendo voltar ao seu país ainda sim o senhor mantinha?
Paulo Freire: Claro, eu mantinha e mantenho a vida toda precisamente porque quem me expulsou do país não foi o país, foi o poder, o poder, que em certo momento da história desse país, o poder que tinha o poder e me expulsou. Eu não poderia penalizar o país inteiro por causa da distorção de um poder que é histórica, entende? Então eu jamais tive qualquer mágoa do Brasil, jamais. Nem sequer eu tive mágoa de organismos, de universidades, por exemplo, que tiveram que ficar caladas, silenciadas quando eu fui preso, minimizado, diminuído, expulso, etc., nada, nada, eu acho que não tinham como brigar.
Repórter: No Brasil hoje, se acredita que existam 40 milhões de analfabetos. O que é que isso diz da sociedade brasileira?
Paulo Freire: Olha, isso continua falando da falta de decisão política da sociedade brasileira, inclusive da classe dominante brasileira, quer dizer, olha, educação é saúde, segurança, esses são problemas que implicam uma vontade política, entende? Eu não tenho dúvida nenhuma que se você tem uma vontade política necessariamente o dinheiro vem. Por exemplo, evidentemente que não vem facilmente, mas você tem que fazer certas transformações nas estruturas do poder. Quer dizer, você não pode pagar menos imoralmente aos professores no país, do Brasil, e se você não fizer uma reforma na política de gastos no Brasil. Quer dizer, veja bem, eu não sou contra que um profissional, um procurador, por exemplo, ganhe muito bem, mas o que eu não posso entender é a distância entre o que ele ganha e que ganha uma professora seja tão grande. Quer dizer, é preciso haver um acerto nessas coisas, quer dizer, eu não estou propondo que se diminua o salário de quem ganha bem, mas o que eu quero, o que é preciso fazer é ‘desumilhar’ quem não ganha, quer dizer, quem é ofendido. Você imagina no nordeste brasileiro tem professor ainda ganhando quinze reais e comprando giz com esse dinheiro.
Repórter: Elas...
Paulo Freire: Elas mesmas. E depois se fala tanto contra, se fala tão mal das professoras brasileiras, dos professores. Eu tenho uma profunda estima pelas professoras e um profundo respeito, porque fazerem o que fazem, apesar de tudo é uma coisa maravilhosa. Agora o descaso histórico do poder nesse país com relação a educação e a dignidade da educadora é uma coisa que me deixa alarmado, quer dizer, esse descaso é tal que as vezes eu tenho a impressão de que presidentes de república, governadores de estado e prefeitos não tiveram na vida deles uma professora primária que os ensinou. Eles estão de tal maneira distante do mundo, de uma professora que se acham superiores à experiência de uma professora e elas só aparecem em determinadas festividades pra dizer que foi a professora do presidente e o presidente abraça, que a impressão que eu tenho é que presidentes de república, governadores de estado vem de outro mundo, de um mundo diferente, caem, são mandados por Papai do Céu, entende? Quer dizer, agora, eu não tenho dúvida nenhuma de que é preciso que um governo, que eu chamo de sanamente insano e só assim você pode consertar as coisas, numa mescla de insanidade na sanidade, entende?
Repórter: Professor, como o senhor quer ser lembrado?

Paulo Freire: (risos) Ótimo! Tá ótimo! Olha, essa é uma pergunta muito gostosa. Eu até que vou aprender a fazer essa pergunta à outras pessoas. Tu sabes que eu nunca tinha pensado nisso, mas agora que você me desafia e talvez a minha resposta seja pouco humilde, talvez seja. Eu acho que não. Quer dizer, eu gostaria de ser lembrado como um sujeito que amou profundamente mundo, e as pessoas, os bichos, as árvores, as águas, a vida.
Fonte: http://pt.scribd.com/doc/178275511/12-Entrevista-Paulo-Freire

Orquestra de Lixo reciclado



"As pessoas se dão conta que não devemos jogar o lixo tão facilmente.
          E nós não devemos descartar as pessoas tão facilmente."


sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

8 plataformas adaptativas que você precisa conhecer

Veja lista com algumas das mais importantes do mundo, incluindo a Smart Sparrow, que permite que qualquer um crie cursos

Já falamos algumas vezes por aqui sobre o poder do uso de Big DataGlossário compartilhado de termos de inovação em educação na educação e como as chamadas plataformas adaptativasGlossário compartilhado de termos de inovação em educação têm ajudado professores, gestores e redes de ensino a dar mais autonomia aos alunos e a personalizar o processo de aprendizagem. Mas a construção desses algoritmos que analisam o desempenho dos alunos em tempo real e que sugerem conteúdos (vídeos, games, exercícios, textos etc.) específicos para as necessidades de cada um não é uma tarefa fácil.
Ainda são poucas as ferramentas que chegaram lá. Aproveitando o gancho da Education Dive, que publicou recentemente a sua seleção das mais famosas plataformas adaptativas, o Porvir preparou a sua versão da lista incluindo plataformas latinoamericanas. Entre elas estão a Smart Sparrow, que permite que qualquer pessoa crie seu próprio curso, a DreamBox, que personaliza o ensino por meio de games, e a Geekie Games, plataforma nacional que ajuda estudantes a se prepararem para o Enem. Confira:
crédito alex/ fotolia.com

Smart Sparrow
Smart Sparrow é uma startup incubada no Grupo de Pesquisas de Ensino Adaptativo da University of New South Wales, na Australia. Criada em 2010, a plataforma é destinada para os ensinos médio e superior e é a primeira a permitir que qualquer pessoa crie seu curso interativo e adaptativo. Em parceria com mais seis universidades australianas, a Smart Sparrow desenvolveu o Adaptive Mechanics, comunidade para praticar mecânica, no curso de engenharia, que já produziu uma redução de 31% para 7% no número de alunos reprovados na disciplina.
DreamBox Learning
DreamBox Learning é uma plataforma adaptativa de matemática para ensino básico e fundamental 1, que utiliza a lógica da gamificação para personalizar o ensino a partir de todas as decisões, resoluções, cliques e dúvidas de cada aluno. O programa, que já é usado em todos os 50 estados dos Estados Unidos, é conhecido por alcançar resultados positivos em testes padronizados.
Grockit
Grockit é uma empresa de aprendizado colaborativo que começou como uma plataforma teste para preparar estudantes para provas. O programa é personalizado não só de acordo com as respostas certas e erradas dos alunos, mas também avaliando a maneira como eles respondem às questões. A plataforma inclui grupos de estudo, vídeos, instrutores ao vivo e games, os testes preparatórios são desenvolvidos para ensino fundamental 2 e médio, a Grock.it também está disponível para iPad.
Wiley e Snapwiz
A plataforma é fruto de uma parceria entre a editora John Wiley & Sons e a Snapwiz, empresa especializada em soluções de aprendizagem adaptativas. Juntas, as duas empresas lançam a WileyPlus with Orion, voltada para o ensino superior. O site visa integrar ensino adaptativo com um ambiente de aprendizagem on-line com foco em pesquisa, prática, colaboração e avaliações que consideram os pontos fortes e necessidades únicas de cada aluno para fazê-los usar seu tempo de maneira mais eficiente. Antes da unificação, o Wiley Plus já era usado por mais de 2 milhões de pessoas em mais de 20 países.
ScootPad
ScootPad é uma plataforma adaptativa para estudantes do ensino fundamental desenvolverem habilidades de leitura e matemática. Com planos gratuitos, o site, que oferece informações em tempo real para os professores e aprendizado por meio de jogos, tem parcerias com o Google in Education, o Edmodo e a Schoology Platform. Lançada em 2012, a plataforma – que já é usada por mais de 25 mil escolas em mais de 8 mil cidades – também está disponível para celulares e tablets com sistema operacional Android e iPads.
Knewton
Knewton é considerada a maior plataforma adaptativa do mundo e oferece conteúdo personalizado, de diferentes formas, para alunos dos ensinos fundamental 1 e 2 e médio. Com a meta de chegar a mais de 10 milhões de alunos até o ano que vem, a plataforma – que fez uma parceria com a Pearson em agosto deste ano – foi considerada, em janeiro de 2012, a 47a companhia mais inovadora do mundo pela Fast Company.
Geekie Games
Geekie Games é uma plataforma brasileira de ensino adaptativo, lançada em agosto deste ano, que oferece ensino personalizado por meio de games para ajudar estudantes a se prepararem para o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio). Depois que cada estudante realiza os simulados on-line, os algoritmos vão identificar suas necessidades e dificuldades, a melhor maneira de ensiná-lo e apresentar essas informações para que o professor também possa adaptar suas aulas. A plataforma já conta com a adesão das secretarias de educação do Acre, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Pará e Pernambuco.
Plataforma Adaptativa de Matemática (PAM)
É uma plataforma adaptativa de matemática uruguaia voltada para estudantes do ensino fundamental e médio, que oferece um sistema de avaliação integral com relatórios de desenvolvimento para alunos e professores. A plataforma com mais de 100 mil exercícios, além de glossários, arquivos de textos e quizzes, e desenvolve micro e macroadaptabilidade, promovendo a personalização tanto individual como para um grupo de estudantes, de acordo com as semelhanças de suas necessidades, conhecimentos e desenvolvimentos.
Fonte: http://porvir.org/porfazer/8-plataformas-adaptativas-voce-precisa-conhecer/20131108

quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

10 máximas para adotar numa plataforma educacional

Os axiomas que vêm a seguir podem ser curtos, mas se você está construindo (ou comprando) uma plataforma de aprendizado, vão aqui 10 dicas que podem ajudar nesse planejamento.
crédito enotmaks / Fotolia.com10 máximas na hora de adotar ou comprar uma plataforma de aprendizagem

1. Materiais múltiplos
A maior parte das redes e dos sistemas de ensino opta por fazer um mix de conteúdos gratuitos e pagos. A preferência é por materiais que dividam o conteúdo em módulos e unidades, em vez de cursos inteiros. O uso de tipos deferentes de materiais também permite a diversificação de estratégias de aprendizado, como a adoção da sala de aula invertida, do ensino híbrido ou de práticas on-line.
2. Avaliação integradaAs avaliações têm incorporado experiências de aprendizagem, em vez de ser uma tarefa única e descontextualizada. Plataformas (e diários de classe) devem coletar e integrar dados vindos de resultados de games, de plataformas adaptativas e de projetos realizados pelos alunos “na vida real”.
3. PersonalizaçãoA personalização é uma tendência. Professores vão querer saber como a plataforma vai ajudá-los a customizar o aprendizado para grupos e para alunos individualmente.
4. Alegria e rigorNotas mais altas e taxas de conclusão maiores acabam trazendo mais engajamento e persistência por parte dos alunos e, consequentemente, aumentam seu interesse e dedicação ao que estão estudando. O aprendizado aprofundado requer boas perguntas, uma cultura de revisão (e a plataforma deverá ter funcionalidades que suportem isso), apresentações públicas e um bom portfólio.
5. SimplifiqueA complexidade de múltiplos fornecedores de conteúdo, sistemas acadêmicos e estratégias pedagógicas é uma oportunidade, mas também uma dificuldade. Professores querem ferramentas que reduzem a complexidade de seus trabalhos. A próxima geração de plataformas precisará de cadastros únicos, estratégias de agrupamento simples e suportes técnicos feitos com agendamento.
6. O básico é gratuitoHá cada vez mais opções de conteúdos sequenciais gratuitos. Mas um material mais inteligente não é tão fácil de encontrar e apresenta importantes diferenciais. Ele é envolvente, oferece várias formas de avaliar as turmas e contribui para o desenvolvimento individual do aluno.
7. Freemium com tudoNão confie cegamente nas ferramentas mais populares usadas por outros sistemas de ensino. Experimente opções de aplicativos que possam ajudar seus professores. Versões freemium [aquelas com versões gratuitas simples e versões pagas com funcionalidades a mais] vão se popularizar em 2014.
8. Aprendizado em grupos ou por competênciasComo escolas têm adotado práticas e políticas de aprendizado baseado em competências apenas lentamente, as plataformas deverão apoiar o desenvolvimento desse tipo de abordagem. Escolas e redes de ensino normalmente usarão tanto programas que se baseiam no aprendizado em grupo quanto no de competências. As plataformas terão de dar suporte para os dois métodos.
9. Design thinkingOs gestores públicos muitas vezes precisam de ajuda para pensar com unir o currílo e as atividades on-line. Eles poderiam usar a metodologia para descobrir novas formas de fazer essa mistura e também enriquecer suas estratégias de uso, funcionalidade e até de implementação da plataforma.
10. Pegar emprestadoAs escolas devem adotar ou criar redes em torno de suas plataformas, mas só as mais talentosas, corajosas e com recursos suficientes devem tentar construir uma plataforma (ver Networks, Platforms, & Procurement). A velha crença de que era preciso comprar ou construir do zero novas plataformas está sendo transformada por todas as APIs [uma interface que roda por trás dos aplicativos] abertas disponíveis no mercado. Os desenvolvedores podem pegar módulos abertos de APIs emprestados de plataformas como Learning RegistryEdFiinBloom, e ActivateInstruction.
Essa matéria foi originalmente publicada no Getting Smart.
http://gettingsmart.com/2014/01/10-platform-axioms/ 
Do Porvir.

quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

Plataforma propõe avanço ao ensino adaptativo

Num momento em que startups de educação e tecnologia estão desenvolvendo produtos cada vez mais personalizados às necessidades dos alunos, uma dupla do Vale do Silício promete colocar mais ingredientes nesse debate ao agregar à plataforma de aprendizado que está desenvolvendo as inteligências trazidas por redes sociais e por ferramentas de colaboração, big data e desenvolvimento profissional. O colombiano Nelson Gonzalez e a norte-americana Ramona Pierson estão tirando do forno o Declara, cujo lançamento oficial ocorre nos próximos meses, mas que já vem sendo testado nos mais diferentes ambientes – de sistema judiciário a salas de aula. A missão, que de pouco ambiciosa não tem nada, é promover o aprendizado profundo em qualquer lugar, em qualquer fase da vida.
“O aprendizado profundo acontece pela colaboração. É daí que sai a inovação, por isso estamos trazendo a revolução do big data e das ferramentas analíticas preditivas [predictive analytics]”, disse Gonzalez, introduzindo termos que ainda podem parecer distantes no universo pedagógico, mas que andam marcando presença constante nas conversas de programadores e de grandes empresas, como Google e Facebook. Mas como nem todo mundo está com o glossário da ciência da computação na ponta da língua, na prática, ele quis dizer que a equipe do Declara está desenvolvendo uma plataforma baseada em algoritmos capazes de usar o grande volume de dados produzidos em seu ambiente virtual ou disponíveis na web para entender a intenção de uma busca, fazer recomendações personalizadas e dar recompensas aos seus usuários.

crédito chirnoagarazvan / Fotolia.comPlataforma propõe avanço ao ensino adaptativo

Mas personalizar o ensino e dar recomendações não é algo que qualquer plataforma adaptativa de aprendizado faz? Sim, mas Gonzalez garante que o Declara vai além. “A inteligência artificial normalmente funciona de maneira muito linear. Ela dá a ordem: ‘Se você vir essa palavra, então faça isso’. Nosso algoritmo é muito avançado, chamado de Hierarchical Deep Recurrent Neural Nets (HDRNN). Ele copia a estrutura sináptica do cérebro”, afirma Gonzalez. Em sendo capaz de estabelecer mais conexões, a plataforma consegue entender a intenção do usuário cada vez que ele faz uma busca. “O que estamos fazendo é busca semântica, que faz uma procura inteligente do conteúdo”, afirmou.
Na plataforma, as ferramentas de buscas inteligentes ajudam a melhorar a interação entre usuários. No caso de ser usado por uma escola, o sistema entende, por exemplo, que um aluno com determinada dificuldade deveria conversar com um professor específico para tirar suas dúvidas. Mas não é só em escolas que a plataforma pode ser usada. De acordo com Gonzalez, “o Declara pode ser usado em qualquer lugar onde o aprendizado ocorra”. Isso porque ele funciona como um esqueleto vazio, que oferece funcionalidades diversas, mas é o contratante da plataforma e seus próprios usuários os responsáveis por “preenchê-la”.
O que estamos fazendo é busca semântica, que faz uma procura inteligente do conteúdo
Assim, no uso mais óbvio relacionado à educação, o Declara pode ser adotado por uma escola ou uma rede de escolas. Nela, alunos e professores criam perfis. Para cada disciplina que o professor dá, o sistema cria uma página, na qual todos podem interagir, postar textos, fotos, vídeos, resultados de pesquisa. Já os alunos criam portfólios digitais, nos quais registram todas as suas produções. Os debates entre os membros da comunidade vão sendo “compreendidos” pela plataforma, que sugere leituras e interações. Os professores têm acesso a todos os dados dos alunos para acompanhar o desenvolvimento de cada um.
Outro uso possível que já vem sendo testado é no treinamento e na capacitação de professores. O Declara foi adotado na Austrália para ajudar no esforço nacional de remodelação do currículo. Fóruns envolvendo professores de todo o país se utilizam da inteligência da plataforma para ajudar docentes a encontrar colegas com interesses parecidos e fomentar o debate. Em uma das telas de administração da plataforma, é possível ver as interações que estão acontecendo naquele exato momento.
Não é suficiente ter dez escolas em São Paulo trabalhando com ensino personalizado ou usando tecnologia. Todas as crianças de São Paulo deveriam ter uma experiência excelente de educação
Na esfera governamental, além de secretarias e ministérios de Educação, Gonzalez conta que um país da América Latina está usando sua tecnologia para capacitar juízes, advogados e professores para a reformulação do sistema judiciário. Em ambientes empresariais, as funcionalidades do Declara podem ajudar no desenvolvimento profissional. O empreendedor conta que uma grande farmacêutica dos EUA estabeleceu como meta redesenhar completamente a forma como elabora remédios. “Para fazer isso, eles têm que reeducar sua força de trabalho porque os funcionários terão que fazer os testes clínicos de um jeito totalmente diferente do que aprenderam. Para fazer isso, eles precisam criar capacidade inovadora dentro das empresas”, afirma Gonzalez, sem dar muitos detalhes sobre o tipo de capacitação que a farmacêutica está promovendo.
Ainda segundo Gonzalez, as possibilidades trazidas pela plataforma são incontáveis, mas é preciso usar a tecnologia não só para trazer o aprendizado profundo. “Temos muitas exceções lindas em projetos-piloto e experimentos pequenos. Agora precisamos dar escala. Não é suficiente ter dez escolas em São Paulo trabalhando com ensino personalizado ou usando tecnologia. Todas as crianças de São Paulo deveriam ter uma experiência excelente de educação”, disse ele.
Fonte: http://porvir.org/porcriar/plataforma-propoe-avanco-ao-ensino-adaptativo/20130802